PERNINHA

 

Me chamo Lucas Ferreira Machado, tenho 28 anos, nascido na cidade de João Pessoa, Paraíba.
Sou portador de uma deficiência chamada de Deficiência Femoral Focal Proximal (DFFP), onde, no caso, o osso da minha coxa esquerda é menor que o da perna direita, o que faz com que meu pé fique na altura do joelho.

Eu cresci tendo bastante dificuldade de me relacionar com as pessoas, por conta da forma que elas me viam por ser deficiente, porém, sempre busquei praticar vários tipos de atividades, vários tipos de esportes. Mesmo assim, nunca consegui encontrar alguma coisa onde pudesse olhar e dizer - Isso aqui eu levo bastante jeito! - Por mais que eu conseguisse fazer igual às outras crianças, de certa forma nada era aquilo que eu dava o meu máximo, entende?

Ali entre 12 ou 13 anos de idade, tive acesso ao DVD da Red Bull BC One através de um amigo, nessa ocasião ele queria me mostrar um outro dançarino, deficiente como eu, que estava participando da competição. Quando vi o B-boy Junior da Wanted Force, vi também os outros B-boys dançando, eu fiquei maravilhado, e como eu já fazia capoeira, acabei achando as duas coisas parecidas.

Comecei a praticar breaking logo em seguida em uma igreja a convite de outro amigo. Acredito que Deus me levou para aquele lugar para ter um contato mais direto com a dança. Até então para mim era uma brincadeira, porém, no fim do ano vi uma apresentação com alguns B-boys dançando e aquilo me chamou muito a atenção, pois eu pude ver uma batalha de breaking. Isso mexeu com a minha parte competitiva, troquei informações com o pessoal e passei a partir dali expandir meus contatos.
 
Próximo dessa época, em parceria com o B-boy Fidel, fundei a Infect Break, grupo do qual não faço mais parte, mas acabou mais tarde se consolidando e fazendo história na Paraíba e no nordeste até os dias de hoje.

Passei a frequentar o Centro da Juventude, local onde conheci meu mentor, B-boy Cazuza, que foi o responsável por me ensinar muitas coisas. Foi com ele que aprendi Moinho de Vento, movimento qual diziam na minha cara que eu jamais iria aprender. 
Ele me incentivou a participar dos eventos, e por conta disso conheci o Vant, percursor da cultura Hip Hop no meu estado, que foi então quem passou a me falar sobre outros tipos de dança, até passei a me envolver com a Dança Contemporânea. 
 
No ano seguinte passei a fazer parte do Coletivo Gang Gangrena criado pela junção de dois grupos, a Original Culture Break e a Primeira Formula True Kingz.
Passei a me focar mais nas atuações como B-boy, comecei a viajar para outros estados e a batalhar com outros nomes de peso no cenário nacional.
Conheci o B-boy Storm na Bahia, onde pude desenvolver com ele um trabalho coreográfico e uma vivência que agregou muito em minha carreira, pois me incentivou e me ensinou várias coisas que ainda não sabia sobre esse novo universo.

Nos anos seguintes participei da minha primeira competição a nível nacional - Freestyle Session Brazil, decidi por me mudar para outro estado. Fiquei cerca de oito meses em Minas Gerais, sempre viajando para os outros estados mais próximos, participando dos eventos e colhendo novas oportunidades.
Foi então que ganhei a Batalha na Vila, que acabou sendo o momento onde tive um reconhecimento a nível nacional, pois pude vencer em cima de vários nomes que já eram tidos como favoritos dentro do cenário, de fato um momento super impactante para mim.

As portas começaram a se abrir, construí uma relação muito boa com a Killa Rockers e isso resultou em um convite para uma participação Crew x Crew na Batalha da Amizade em 2014.
Nós já tínhamos afinidade, já tínhamos convivido, então foi algo bem natural. A partir dali passei a ser membro do grupo. Vencemos o Master Crews nesse ano, no dia do meu aniversário, foi mágico!

Com tudo isso que vinha acontecendo, minha bagagem aumentou, comecei a desenvolver trabalhos como jurado, apresentações e pude passar a oferecer workshops, que era algo que eu tinha muita dúvida no início, pois não sabia como poderia ensinar o que sei por conta da minha deficiência. Depois que desenvolvi uma metodologia que me possibilitou ensinar para outras pessoas que não tinham deficiência, eu comecei a expandir esse trabalho.

No final de 2017 pude competir pela primeira vez internacionalmente no Hip Hop New School em Quimper, França. 
Recebi o convite para fazer parte de um grupo chamado ILL-Abilities, formado somente por deficientes físicos do mundo inteiro, desenvolvendo um trabalho de shows, workshops e palestras motivacionais voltadas a pessoas em situação de risco, não só com portadores de deficiência.

Gosto de pensar que a Gang Gangrena é como uma mãe que me criou na cena, a Killa Rockers é como um pai, que chega um pouco depois para botar ordem na casa e a ILL Abilities é como uma avó, que me dá os bons conselhos de como chegar mais rápido nos meus objetivos.
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Eu acredito no Hip Hop como movimento de transformação social, acredito que na minha vida o Hip Hop é uma ferramenta de ajuda às pessoas. Independente se pratica ou não, pois foi através do Hip Hop que consegui me comunicar com o mundo, me expressar com as pessoas. Então, acredito que Deus usa o Hip Hop como porta de entrada para que você tenha a oportunidade de falar com alguém ou de mostrar seu talento a alguma pessoa, e, assim, toca-la de uma forma positiva.
 
Em 2015 tive a ideia de fazer um evento independente que abrangesse os quatro elementos da cultura Hip Hop e que pudesse trazer um pouco das experiências que eu estava tendo fora para a galera do meu estado. Foi daí que surgiu o Chega Que é Certo, fruto de uma gíria da minha cidade que digamos que poderia ser, "Vem porquê vai ser muto bom". 
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Não existe problema que não possa ser resolvido, tudo pode ser uma porta de transformação positiva. Quando você quer algo, quando você determina alguma coisa na sua vida, não existe limite, não existem barreiras.
Se eu quero alguma coisa eu corro atrás, eu batalho, assim como fazemos na roda de break. Eu treino, ralo e então eu consigo. Não é nem questão religiosa, mas se acreditar no seu próprio potencial e acreditar naqueles que estão ao seu lado, você pode tudo, nós podemos tudo!